“A invenção mais bonita da Itália, além do espaguete” – morreu a icônica atriz Claudia Cardinale


Claudia Cardinale, nascida relativamente "tardia" na Tunísia, em 15 de abril de 1938, garantiu seu lugar no cenário cinematográfico italiano quando a Cinecittà ainda se concentrava inteiramente no carisma de Sophia Loren e Gina Lollobrigida. Mesmo diante de concorrentes internacionais — de Brigitte Bardot a Marilyn Monroe —, ela sempre teve uma boa atuação.
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O que certamente foi crucial foi que ela sempre tomou as decisões certas em sua carreira: "CC", que era mais jovem que as grandes estrelas do cinema do pós-guerra, não só podia contar com seu título de "plus belle Italienne de Tunis", como também atuou em uma série de obras-primas que lhe garantiriam uma posição única na história do cinema.
Solução a partir do contexto familiarSua história de vida pessoal também é incomum, pelo menos sob a perspectiva atual: ela deve sua juventude no Norte da África aos seus avós sicilianos, que, diante da pobreza no século XIX, decidiram cruzar o Mediterrâneo. Os anos escolares que passou no então protetorado francês a distanciaram de sua origem familiar a tal ponto que ela tinha apenas um domínio rudimentar do italiano e teve que ter suas falas dubladas por colegas por longos períodos.
Suas primeiras aparições na tela, no entanto, foram silenciosas: em "Les anneaux d'or", de René Vautier, em 1956, ela interpretou uma jovem berbere, seguido dois anos depois por "Goha le simple" (com Omar Sharif), no qual ela foi escalada para o papel de uma serva árabe.
Como ela mesma revelou anos depois, também sofreu um estupro naquele mesmo ano, o que a levou a engravidar. Após ser convencida pelo produtor de que a indústria cinematográfica não entendia mães solteiras, ela passou a criança como se fosse seu irmão mais novo por anos.
O quão atual era a questão das zonas de tabu social naquela época também pode ser percebido pelo roteiro de «La ragazza con la valigia» (1961) de Valerio Zurlini, no qual ela desempenhou seu primeiro papel principal: ela foi capaz de enriquecer a personagem que ela incorporou, a beleza provinciana sem um tostão que tem que confiar seu filho a uma família adotiva para capturar um admirador rico, com uma emoção deslumbrante na qual se pode facilmente ouvir uma experiência pessoal hoje.
Embora Zurlini demonstrasse um notável senso de realidade social, ele também demonstrava um olhar aguçado para o potencial glamouroso de Cardinale. A cena em que ela desliza escada abaixo de uma propriedade rural aristocrática, acompanhada pelo tema de Aida, de Verdi, parece ter desafiado seus futuros diretores.
Em "Gattopardo", de Visconti, ela se movia pelo palácio do Príncipe Salina como se estivesse prestes a conquistá-lo; na sequência de abertura de "Era Uma Vez no Oeste", Sergio Leone tinha a câmera içada por um guindaste para não perder sua personagem na agitação da cidade ocidental. Em "Otto e Mezzo", de Fellini, ela apareceu como uma figura verdadeiramente luminosa, uma figura onírica que momentaneamente ajudou o diretor, preso em um pesadelo, a alcançar a paz mental.
MUSEU NACIONAL DE CINEMA AP
Em uma conversa com Alberto Moravia, publicada na revista Esquire em 1961, ao mesmo tempo desconcertante e interessante, na qual o escritor incitou a atriz a se descrever como um "objeto", ela se revelou não apenas isenta de qualquer narcisismo, mas também francamente crítica de sua aparência. Afirmou que achava seu corpo "estranho".
Talvez essa atitude também tenha facilitado sua entrada na comédia: quando David Niven, parceiro de Cardinale em "A Pantera Cor de Rosa", disse certa vez que ela era "a invenção mais linda da Itália, depois do espaguete", ela certamente considerou a frase "o elogio mais simpático" que já recebera. Presumivelmente, a observação também lhe pareceu encantadora, pois ressaltava a popularidade que a atriz jamais havia perdido.
Em Hollywood, foi contratada por Henri Hathaway em 1964 para "Mundo Circo", no qual contracenou com John Wayne ao lado de Rita Hayworth. Entre suas produções italianas, destacam-se "Il bell'Antonio", de Mauro Bolognini, e "Rocco e suoi fratelli", de Visconti. Filmou "Corleone" em 1977, sob a direção de seu parceiro Pasqualie Squitieri, que a escalou para quase dez produções.
Após se estabelecer em Paris, trabalhou cada vez mais na França na década de 1980. Seus traços sulistas lhe permitiram atuar na saga familiar armênia "Mayrig", de Henri Verneuil, e participar da biografia épica do Sultão Abd el Malek ("A Batalha dos Três Reis"). A Suíça homenageou Cardinale em 2011, quando ela recebeu o Prêmio pelo Conjunto da Obra no Festival de Cinema de Locarno.
A elegância do envelhecimentoO que impressionou foi a graciosidade com que ela envelheceu: uma joia da coroa de sua obra posterior é "Gebo et son ombre" (2012), de Manuel de Oliveira, no qual ela contracenou com Michael Lonsdale e Jeanne Moreau. Seu status como Embaixadora da Boa Vontade da UNESCO para os Direitos da Mulher lhe permitiu manter um equilíbrio entre a atuação e a vida pública, e ela também se mostrou muito autoconfiante em seu compromisso com a luta contra a epidemia de AIDS.
Ela olhou para sua própria carreira com serenidade. Quando o Festival de Cinema de Cannes ilustrou o pôster oficial em 2017 com uma fotografia sua e teve a imagem de 1959 retocada por um artista gráfico anônimo, ela aceitou o insulto com naturalidade: era uma "feminista convicta", afirmou, mas a questão era "apenas sobre cinema". Conforme anunciado por seu agente, Claudia Cardinale faleceu em 23 de setembro.
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